Catolicismo e trabalho: a cultura militante dos trabalhadores de Belo Horizonte (1909-1930) – Deivison Amaral

Houve um tempo em que a primeira imagem que vinha à cabeça quando se pensa no movimento operário na Primeira República (1889-1930) era a do operário anarquista, imigrante italiano, radical em suas ações e que objetivava a revolução social. Essa imagem não é universal. Os movimentos de matriz reformista e mais conservadores ganharam pouco espaço na historiografia e trabalhadores e trabalhadoras que aderiram às fileiras desse tipo de organização operária foram recorrentemente criticados por um suposto caráter desmobilizador de sua militância.  
A história das primeiras organizações de trabalhadores de Belo Horizonte, onde foi majoritária a presença do sindicalismo reformista católico, é um exemplo da diversidade da classe operária organizada nas primeiras décadas republicanas. Na cidade, a militância católica não teve caráter desmobilizador, ao contrário, foi incentivadora da organização de sindicatos profissionais. Essa história é contada no livro de Deivison Amaral, Catolicismo e trabalho:  a cultura militante dos trabalhadores de Belo Horizonte (1909-1930), coeditado pelas editoras Appris e Prismas. O livro analisa a cultura militante católica em Belo Horizonte, entre 1909 e 1941, investiga a dimensão associativa e a atuação de trabalhadores, organizações, sindicatos e militantes leigos. Ademais, relaciona aspectos da formação política e religiosa dos trabalhadores e militantes leigos com a dimensão transnacional de constituição do movimento operário cristão.   

Para adquirir a obra: http://tiny.cc/uud14y ou amaraldga@gmail.com

Memórias de Um Rio Fabril | Paulo Fontes,Thais Blank e Isabel Joffily | 2017

Sinopse: Três fábricas do Rio de Janeiro mostram a força do passado industrial e a sua importância para a memória social carioca. Cada uma delas teve um destino após o fechamento, mas todas são capazes de falar sobre a cidade na qual nasceram e morreram.
Memórias de Um Rio Fabril (Paulo Fontes, Thais Blank e Isabel Joffily, Rio de Janeiro/RJ, 2017)

Ficha técnica:
Direção: Paulo Fontes, Thais Blank e Isabel Joffily
Roteiro: Paulo Fontes, Thais Blank e Isabel Joffily
Fotografia: André Lavaquial, Eduardo Carvalho, Pedro de Alencar e Pedro Rossi
Produção: Coevos Filmes e CPDOC-FGV
Arte: NAD/CPDOC-FGV
Elenco: Wilson Rossi, Emernegilda Dias Moreira, Edna Vitalina da Costa e Adelina Novaes (narração)
Som direto: Igor Leite
Edição de som: Guilherme Farkas
Montagem/Finalização: Afinal Filmes
obra licenciada via Creative Commons pelo tipo:
atribuição – uso não comercial (by-nc)

Mundos do Trabalho e Ditaduras no Cone Sul (1964-1990) – Paulo Fontes, Larissa Correa, Jean Sales e Alejandra Estevez

Mundos do Trabalho e Ditaduras no Cone Sul (1964-1990) é o livro resultado de seminário realizado com o mesmo título realizado na Fundação Getulio Vargas em 2017. Organizado por Paulo Fontes, Larissa Correa, Jean Sales e Alejandra Estevez, a obra reúne as principais contribuições das mesas redondas de um evento que, pela primeira vez, procurou colocar em perspectiva comparada a historiografia sobre trabalhadores nos regimes ditatoriais de Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.

Para adquirir a obra: https://editoramultifoco.com.br/loja/product/mundos-do-trabalho-e-ditaduras-no-cone-sul-1964-1990/

O ataque ao (Ministério do) Trabalho – Paulo Fontes e Heliene Nagasava

O Ministério do Trabalho foi instituído em novembro de 1930, cerca de um mês depois da chegada de Getúlio Vargas ao poder. Sua criação atendia às crescentes demandas por uma maior atuação do Estado na regulação das relações do trabalho e na organização do mundo sindical. A “questão social”, como era chamada, era motivo de temor e ávidos debates entre as elites políticas e econômicas do país. Também em nível internacional, os conflitos sociais e os impactos da Revolução Russa de 1917 colocavam as relações entre capital e trabalho no centro da vida pública e inspiraram, entre outras ações, a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1919.

Uma das primeiras medidas do novo governo, a pasta logo seria chamada de “Ministério da Revolução”. A alcunha era paradoxal. Comandado por políticos conservadores e inspirado por ideias corporativistas, o Ministério tinha como objetivo principal o controle dos trabalhadores e suas organizações, visando a conciliação de interesses entre empregados e patrões. Não por acaso sua denominação completa até os anos 1960 seria Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.

Ao longo das décadas de 1930 e 40, o Ministério do Trabalho se tornaria a menina dos olhos da política varguista. Foi através dele que uma série de direitos sociais, que culminariam na CLT em 1943, foram promulgados. Sua atuação impactaria não apenas as relações de trabalho, mas as próprias concepções de cidadania e nação no Brasil. No após-guerra, manteria sua importância, articulando uma máquina sindical e previdenciária de peso fundamental no jogo político dos anos 1950 e 60.

Para os trabalhadores e suas organizações, em um momento de ascenso de mobilizações, o Ministério tornou-se um desaguadouro fundamental para reivindicações e um campo de disputas em suas lutas por direitos. Conquistas civilizatórias como o direito de sindicalização dos trabalhadores rurais e o 13o salário ocorreram neste contexto. Para muitos, no entanto, o Ministério do Trabalho era uma espécie de QG de uma suposta e temida “República Sindicalista”. Não à toa, o Ministério do Trabalho foi um alvo preferencial da repressão política após o golpe de 1964. Os militares, no entanto, jamais pensaram em acabar com ele. Reforçando as medidas de controle social já presentes na legislação, procuraram criar um novo modelo de trabalhador, de sindicatos e de ministério. Não foram inteiramente bem sucedidos, mas em grande medida conseguiram diminuir a força política da pasta.

O peso dos movimentos sociais e do “novo sindicalismo” na redemocratização do país colocou o trabalho novamente no centro do debate político e teve influência direta na ênfase nos direitos sociais da Constituição de 1988. Nela, os valores sociais do trabalho foram vistos como fundamentos da própria República. Embora tenha mantido muitas funções no ordenamento sindical, o Ministério do Trabalho seria extirpado de seu caráter intervencionista. Nos últimos anos, também assumiria importante papel de inspeção das relações de trabalho, promoção do emprego e defesa da saúde e segurança dos trabalhadores. Sua fiscalização tem sido vital na luta pela erradicação do trabalho escravo contemporâneo.

A proposta de extinção do Ministério do Trabalho por parte do Presidente eleito Jair Bolsonaro não deve ser vista como mera medida administrativa ou como uma “modernização” das relações trabalhistas. Trata-se de um ataque aos direitos dos trabalhadores. Para além do simbolismo do término de uma pasta vinculada aos direitos sociais, o fim dos 88 anos do Ministério do Trabalho está em perfeita sintonia com uma Reforma Trabalhista que além de destruir direitos e enfraquecer os sindicatos e a Justiça do Trabalho, prometeu e não entregou empregos.

É conhecido o pouco apreço de Bolsonaro e sua equipe pelos direitos trabalhistas. Como deputado gabou-se de ser o único a votar contra a PEC das domésticas. Reiteradamente afirmou que os trabalhadores teriam que optar entre o emprego ou direitos. O possível fim do Ministério do Trabalho é uma opção política da sua agenda neoliberal autoritária. Uma espécie de histórica revanche patronal. No entanto, estamos em um país com mais de 13 milhões de desempregados, precarização galopante do emprego, recordes de acidentes de trabalho e onde os efeitos da quarta revolução industrial convivem com o trabalho análogo à escravidão. O Ministério do Trabalho pode ser expulso pela porta, mas o conflito social voltará pela janela. Aliás, permanecerá na sala de estar.

Paulo Fontes é professor do Instituto de História da UFRJ e pesquisador produtividade do CNPq.
Heliene Nagasava é servidora do Arquivo Nacional e doutoranda no CPDOC/FGV.

Publicado originalmente: Jornal do Brasil
Data original da publicação: 14/11/2018
Crédito da imagem: Arquivo/Agência Brasil

Vale Mais #01 – Ministério do Trabalho




Vale Mais é um podcast do Laboratório de Estudos dos Mundos do Trabalho da UFRJ. O objetivo é discutir história, trabalho e sociedade, refletindo sobre temas contemporâneos a partir da perspectiva da história social.

O episódio #01 é sobre o Ministério do Trabalho, que foi fundado em 1930, durante o governo de Getulio Vargas, e extinto em janeiro de 2019, na reforma ministerial do governo de Jair Bolsonaro. Para falar sobre isso convidamos a historiadora especialista no tema, e servidora do Arquivo Nacional, Heliene Nagasava, e o historiador e professor da UFRJ, Paulo Fontes.

Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

Roteiro e Produção: Deivison Amaral, Heliene Nagasava e Yasmin Getirana.

Disponível também no Spotify, Castbox e PocketCasts.
Ouça e inscreva-se para receber os próximos episódios da temporada do Vale Mais.

Vale Mais #29: The Second World War and the Rise of Mass Nationalism in Brazil, por Alexandre Fortes Vale Mais

ERRATA: O professor se refere, em certo momento, a "janeiro de 1941", mas o correto é janeiro de 1942, quando começam as transmissões de rádio do Marcondes Filho, coincidindo com a ruptura do Brasil com o Eixo. Está no ar o segundo episódio da nova temporada do podcast Vale Mais, do LEHMT-UFRJ! Nesta temporada, convidamos pesquisadoras e pesquisadores para discutir projetos, livros e teses recentes que aprofundam debates interdisciplinares sobre os mundos do trabalho. No segundo episódio, conversamos com Alexandre Fortes, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e autor do livro The Second World War and the Rise of Mass Nationalism in Brazil (2024). A obra propõe um reexame da história do Brasil nas décadas de 1930 e 1940 a partir de diálogos com as novas perspectivas historiográficas internacionais sobre a Segunda Guerra Mundial. Fortes ressalta a efervescência econômica para suprir as necessidades do conflito global. Nesse contexto, a classe trabalhadora esteve no centro das lutas pela redemocratização, justamente por conta de sua experiência no processo de esforço de guerra e das ambiguidades decorrentes da intensificação da superexploração do trabalho, da derrota do nazifascismo e da perspectiva de “descontar o cheque patriótico”. Nesse sentido, a guerra e a ação dos trabalhadores foram fundamentais para redefinir noções de classe, raça e nação. Para saber mais sobre esse assunto, ouça o episódio! Não esqueça também de compartilhar nas redes sociais e acompanhar os próximos!
  1. Vale Mais #29: The Second World War and the Rise of Mass Nationalism in Brazil, por Alexandre Fortes
  2. Vale Mais #28: O poder e a escravidão, por Bruna Portella e Felipe Azevedo
  3. Vale a Dica #14: Orgulho e Esperança, de Matthew Warchus
  4. Vale a Dica #13: 2 de Julho: a Retomada, de Spency Pimentel e Joana Moncau
  5. Vale a Dica #12: SAL, idealizado e dirigido por Adassa Martins

Artigo Apontamentos sobre a Indústria Têxtil Fluminense no Contexto Pós Segunda Guerra Mundial: Padrões e Peculiaridades de Fábricas com Vila Operária – Felipe Ribeiro

O artigo compõe um dossiê sobre industrialização fluminense e busca apresentar um panorama do setor têxtil de algodão no estado do Rio de Janeiro a partir da Segunda Guerra Mundial, período considerado “áureo” para as fábricas de tecidos no país. O texto propõe uma análise de algumas unidades fabris e suas vilas operárias, a partir do conceito proposto pelo antropólogo José Sérgio Leite Lopes, interpretando padrões e peculiaridades entre as fábricas estudadas.

Artigo Apontamentos sobre a Indústria Têxtil Fluminense no Contexto Pós Segunda Guerra Mundial: Padrões e Peculiaridades de Fábricas com Vila Operária, na Revista Espaço e Economia. Acessar: https://journals.openedition.org/espacoeconomia/3269?fbclid=IwAR2JJZZpNu32DOWI3v3-Egfya_375Ts0hXkRTohy-rheCzQ-FR1DNPRasWU

Ilustração: Vila Operária da Fábrica Andorinhas no início da década de 1940 (Acervo Felipe Ribeiro)

Dossiê Baixada Fluminense: um Calhamaço de Pesquisa para Superar o Close-Up da Fronteira – Felipe Ribeiro

O dossiê reúne uma coletânea de artigos sobre a Baixada Fluminense, assinada por uma nova geração de historiadores, cuja produção acadêmica tem se destacado nas últimas décadas. Partindo de uma reportagem da revista “O Cruzeiro”, datada de 1961, repleta de clichês e estigmas sobre a Baixada – representada como a “fronteira sangrenta do Rio de Janeiro” – este dossiê propõe outras imagens sobre a região, mais densas, instigantes e críticas. Organizado por Jean Sales, Alexandre Fortes, Álvaro Nascimento e Felipe Ribeiro, a coletânea de artigos apresenta um “calhamaço” de estudos recentes sobre a Baixada Fluminense, visando desconstruir caricaturas e reforçando análises criteriosas que deem conta da complexidade da região.

Dossiê Baixada Fluminense: um Calhamaço de Pesquisa para Superar o Close-Up da Fronteira, na Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro (AGCRJ)

Ilustração: Revista “O Cruzeiro”. 04/11/1961. p.22.

Artigo Associativismos de trabalhadores favelados no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte (1955-1964) – Samuel Oliveira

Associações de moradores, entidades recreativas, escolas de samba, grupos religiosos, entre outros compõe um complexo repertório das formas associativas nas favelas, atravessado por diferentes identidades de classe e projetos sociais e políticos. Entre 1954 e 1964, nas favelas do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, organizaram-se “uniões”, “federações” ou “coligações” de trabalhadores favelados, articulando mais de uma localidade com objetivo de lutar pelo direito de moradia.

Os movimentos de trabalhadores favelados construíram uma gramática que politizava as injustiças sociais do processo de urbanização brasileiro e propuseram uma “reforma urbana” nas mobilizações pelas Reformas de Base no final dos anos 1950 e início de 1960. Contestavam um urbanismo que estigmatizava as favelas e viam esses espaços como transitório no tecido urbano-industrial. Lutavam pelo direito de moradia e urbanização de várias localidades.

Analisando esse movimento social, o artigo critica as interpretações clássicas do populismo no sistema político brasileiro. Construída a partir de um viés elitista, essa interpretação do passado considerou os moradores de favelas despreparados para o exercício da democracia e cultura urbana, por serem migrantes que tinham um comportamento político dos “sertões” e do interior do Brasil. Essa interprestação desconsiderou a complexa mediação entre as estratégias de ocupação do tecido urbano, a cultura popular e a expansão dos direitos políticos e civis no período de 1945 e 1964.

Associativismos de trabalhadores favelados no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte (1955-1964), na revista Estudos Históricos v. 31, n. 65 (2018). Acessar: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/74943

Ilustração: O folheto Carta dos Direitos do Trabalhador Favelado foi distribuído entre os participantes do I Congresso dos Trabalhadores Favelados organizado em Belo Horizonte, em 1 de maio de 1962. Cf. ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Fundo DOPS. Arq. Pasta 0119.