Chão de Escola #07: Do Abono de Natal ao Décimo Terceiro Salário

Autores: Profª Luciana Pucu Wollmann1 e Prof. Felipe Ribeiro2

Apresentação da atividade

Segmento: 9º Ano do Ensino Fundamental (regular e EJA)

Objetivos gerais:

– Refletir sobre a criação do Décimo Terceiro Salário no Brasil e as lutas de trabalhadores e trabalhadoras em prol deste direito.

– Problematizar certo imaginário político da conquista dos direitos trabalhistas compreendidos enquanto dádiva, e não como um processo de lutas.

– Enfatizar a importância do protagonismo político de trabalhadores e trabalhadoras durante a República, conquistando direitos e promovendo alterações na sociedade por meio de mobilizações coletivas.

Habilidades a serem desenvolvidas (de acordo com a BNCC):

– (EF09HI06) Identificar e discutir o papel do trabalhismo como força política, social e cultural no Brasil, em diferentes escalas (nacional, regional, cidade, comunidade).

– (EF09HI09) Relacionar as conquistas de direitos políticos, sociais e civis à atuação de movimentos sociais.

– (EF09HI23) Identificar direitos civis, políticos e sociais expressos na Constituição de 1988 e relacioná-los à noção de cidadania e ao pacto da sociedade brasileira de combate a diversas formas de preconceito, como o racismo. 

Duração da atividade: 05 aulas de 50 min.

Aulas Planejamento
01 Etapa 1
02 e 03Etapa 2
03 e 04Etapa 3
05Etapa 4

Conhecimentos prévios (conforme a BNCC): 

– Unidade Temática: O nascimento da República no Brasil e os processos históricos até a metade do século XX

– Objetos de conhecimento: O período varguista e suas contradições – A emergência da vida urbana e a segregação espacial – O trabalhismo e seu protagonismo político 

Atividade

Recursos: Projetor com som, Livro didático e Cópias 

Etapa 1: Apresentação da temática


A turma será convidada a participar de uma roda de conversa. A proposta é estimular que cada estudante apresente suas reflexões coletivamente de forma oral, a partir das seguintes questões sugeridas:
1. Já ouviram falar em Décimo Terceiro Salário? Sabem o que é?
2. Seus pais e/ou responsáveis recebem o Décimo Terceiro Salário?
3. Caso recebam, qual o principal uso do Décimo Terceiro Salário?
4. O Décimo Terceiro Salário é importante na vida das pessoas? Porquê?
5. Como podemos definir o Décimo Terceiro Salário: um direito, uma doação, uma conquista, uma farsa…?
A partir das falas da turma, é recomendado que o professor ou professora organize as principais respostas das questões em um quadro, de forma compartilhada. Depois desse debate introdutório, sugerimos que o docente exiba o vídeo “A luta pelo Abono de Natal”, elaborado pela equipe do “Chão de Escola”.

Etapa 2: Problematização da temática

– Exibição do vídeo “5 coisas sobre 13º salário”, publicado no canal TST Tube.

– Leitura do texto “A farsa do 13º salário”, publicado no blog O Contador.

Após a exibição do vídeo e leitura do texto, a turma será dividida em grupos de quatro ou cinco integrantes. Cada grupo receberá duas fichas para análise do material apresentado.

Finalizada a atividade, sugerimos que o docente ouça as respostas dos estudantes e procure fazê-los refletir sobre a relação entre a autoria das fontes e o seu conteúdo, as diferentes opiniões a respeito do tema e sobre o período em que foram produzidas.
Como tarefa de casa, a turma será estimulada a consultar seus pais, responsáveis e familiares sobre o que é o Décimo Terceiro Salário, podendo seguir parte do questionário inicial, para compartilhamento na próxima aula. 

Etapa 3: Desconstruindo a lógica da dádiva 

A turma será convidada a compartilhar sobre as respostas à consulta realizada com seus pais, responsáveis e familiares acerca do Décimo Terceiro Salário. Após este período introdutório, cada estudante deverá assinalar no livro didático utilizado pela disciplina as imagens e frases que indicam o papel exercido pelo presidente Getúlio Vargas no processo de construção da legislação trabalhista no Brasil.
Em seguida, a turma será dividida em grupos de quatro ou cinco integrantes para analisar um conjunto de fontes, totalizando quatro coletâneas de fontes no total. Se for o caso da turma ser mais numerosa, o professor ou professora poderá repetir o conjunto de de fontes. 

GRUPO 1:

Fonte: Imprensa Popular. 05/11/1953. p.1. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

“Os primeiros registros de que temos notícia falam de greves e demandas pelo abono natalino em 1921 na Cia Paulista de Aniagem e na indústria Mariângela. Em  1944  ocorreu uma greve geral pelo seu pagamento em Santo André, uma vez que fora concedido aos operários da Pirelli em 1943. Na onda de greves que se alastrou de dezembro de 1945 a março de 1946, a luta pelo prêmio de final de ano era a principal reivindicação na maioria delas,  envolvendo  categorias  como  ferroviários  da  Sorocabana,  trabalhadores  da  Light,  tecelões, metalúrgicos, gráficos e químicos em São Paulo. (…) O 13° salário é um desses casos de reivindicação surgida no chão de fábrica, legitimada nas relações costumeiras entre patrões e empregados em algumas firmas, transformada em lei. As custas de greves, demissões, abaixo assinados, prisões e cuja memória é depois ofuscada pelo brilho da lei que, supõe-se, como toda lei, deve ter sido iniciativa de algum presidente, deputado ou senador”.

Murilo Leal Pereira Neto
Historiador e autor do livro “A reivenção da classe trabalhadora” 
(Editora da UNICAMP, 2011)

O Radical, 19/12/1948, p. 1. Arquivo Público do Estado do Rio do Janeiro/APERJ. Divisão de Polícia Política (1944-1960). Movimento Grevista no Rio de Janeiro.

“É em fins de dezembro de 1945 que o dique se abre com a greve do abono de Natal do pessoal da energia elétrica que, alcançando imediatamente uma escala nacional, deverá atuar como um detonador para o movimento operário em todo país. É assim que, se no ano de 1945 registra apenas doze greves, os dois primeiros meses de 1946 somarão mais de sessenta, indicando um nível de ascenso do movimento operário que, embora momentâneo, só será ultrapassado nos anos 60”.

Francisco Weffort
Cientista Político e autor do artigo “Origens do sindicalismo populista no Brasil”(Estudos CEBRAP. v.4. 1973)

Grupo 2:

“Nesta época, o funcionalismo público e privado de um modo geral espera ansiosamente pelo 13° salário. Esta conquista não foi fácil de conseguir e veio coroar velhas reivindicações. O momento é a hora de pagar contas ou de consumir e, neste caso, está o presente de Natal a familiares e amigos, uma vez que a quantia é depositada na primeira quinzena de dezembro (o Governo Federal, atualmente, divide em duas parcelas, a primeira paga em junho). Este pagamento extra é uma gratificação equivalente a um mês de salário, daí a alusão a ser 13°. É o equivalente ao bônus de Natal, em países como Alemanha, Argentina e Portugal. Mas será que uma lei dessas veio decima para baixo?”

Luzia Álvares
Cientista Política e autora do artigo “Abono de Natal”
(O Liberal. 14/12/2012. p.2)

Fonte: Diário do Congresso Nacional. 11/06/1959. p.2021. Portal da Câmara dos Deputados.

“Nos anos 40, houve muita greve, surgindo inclusive um movimento dominante pelo    Abono de Natal. Fazia-se muita greve nas proximidades do Natal para se conseguir o abono. Todo o ano aquilo se repetia e não se conseguia nada. Até que o Aarão Steinbruch se elege deputado federal, pega o Abono de Natal e chama de décimo terceiro, virou o décimo terceiro que está aí”.

Irun Sant’Anna
Médico e fundador da União Nacional dos Estudantes (UNE)
(Entrevista concedida em 06/04/2006. Acervo: Felipe Ribeiro)

Fonte: O Momento. 01/01/1948. p.1. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

Grupo 3:

Fonte: O Globo. 26/04/1962. p.1. Acervo O Globo.

“Para os trabalhadores, um beneficio concedido pelos patrões anualmente. Para os patrões, um pequeno agrado ou gorjeta ofertado aos trabalhadores às vésperas do Natal. (…) A lei 4090, que garante o pagamento do abono de Natal aos trabalhadores, assinada no dia 13 de julho de 1962, esconde uma série de batalhas travadas entre patrões e operários ainda na década de 1950”.

Larissa Rosa Corrêa
Historiadora e autora do artigo “Abono de Natal: gorjeta, prêmio ou direito?”
(Revista Esboços. Nº 16)

“Surge o chamado de greve geral, para 13 de dezembro de 1961. Um panfleto reclama:  ‘nas  gavetas  da  Câmara  Federal,  desde  1959,  dorme  um  projeto  de  lei’:  o  da  consagração do abono de Natal em 13º salário. (…) Na  véspera  da  greve,  circulam  rumores  sobre  alvoroços  na  Federação  das  Indústrias  do  Estado  de  São  Paulo  (FIESP):  os  patrões  haviam  resolvido  se  manifestar  contra  o  crédito  natalino. (…) Ao  mesmo  tempo  em  que  o  operariado  brasileiro  se  notabilizava  por  dar  vida  a  uma  extraordinária  máquina  de  trabalho  –  o  que  mudou  a  cara  do  país  –,  havia  expressivas  experiências  de  independência  e  maturidade  e  de  ampliação  da  cidadania,  nos fazendo ver que os trabalhadores lutavam por seus direitos”

Antonio Luigi Negro,
Historiador e autor do artigo “Desfazendo preconceitos sobre a história do Brasil”
(Revista Histórica. nº 05. 2005)

Fonte: Tribuna do Povo. Setembro de 1949. p.3. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

Grupo 4:

Fonte: Texto integral da Lei nº 4.090/1962. Portal da Câmara dos Deputados.

“Há alguns anos tive uma pequena indústria e, durante muito tempo, lutei para   conseguir   ganhar   alguma   coisa   com   ela. Anos seguidos tive prejuízos, embora os operários que nela trabalhavam sempre recebessem seus ordenados. (…) Este salário, este abono de Natal, não é justo, porque para o aumento do custo  de  vida,  segundo  o  que  se  alega,  existe  o  salário  mínimo  e  os  reajustes.  Se  não  está  certo,  reajuste-se,  mas  esse  salário,  não  previsto para uma indústria que não tenha capacidade de concede-lo, é uma forma de levar-nos a um desastre e talvez a uma situação grave”.

Eduardo de Souza Queiroz 
Vereador pela UDN na cidade de São Paulo
(Diário Oficial do Estado. 13/12/1961. p. 50)

“O abono de Natal dependia do humor da chefia. Alguns chefes não davam nada. Outros até davam alguma coisa, por livre e espontânea vontade, mas costumava ser muito pouco. Os patrões entendiam que o abono de Natal era uma gorjeta — não era obrigatória e era no valor que mais lhes fosse conveniente (…)”. 

Miguel Terribas Rodrigues
Operário da Siderúrgica Aliperti
(https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2012/07/17/patroes-viam-abono-de-natal-como-gorjeta-diz-ex-metalurgico-de-83-anos).

Fonte: Momento Feminino. 19/12/1947. p.1. Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

Com base na análise dos materiais distribuídos, cada grupo deverá elaborar uma cronologia histórica do Décimo Terceiro Salário, relacionando as datas, os episódios,  personagens envolvidos e o respectivo Presidente de República que governava o país. Ao final, as cronologias elaboradas pelos grupos serão compartilhadas com toda a turma e unificada. A partir desse quadro geral, a turma deverá responder as seguintes perguntas:

1. Antes de se tornar lei, como era conhecido o Décimo Terceiro Salário?
2. Quanto tempo levou entre o registro da primeira mobilização em prol deste direito e a promulgação da lei?
3. Quais os principais personagens envolvidos nesse processo histórico?

Etapa 4: Construindo uma nova narrativa sobre o Décimo Terceiro Salário

Como avaliação da atividade, a turma será convidada a elaborar uma nova narrativa histórica sobre o Décimo Terceiro Salário, a partir do que foi trabalhado na disciplina (livro didático, materiais compartilhados, bem como a turma poderá ser estimulada a pesquisar mais materiais sobre as campanhas pelo Abono de Natal em sua região e/ou os impactos do Décimo Terceiro Salário na cidade em que reside).
Esta nova narrativa poderá ser elaborada em diversos formatos, por grupos ou toda turma conjuntamente: uma exposição de cartazes, um pequeno jornal estudantil, um minidocumentário, um estudo de caso, um vídeo no Youtube, enfim… O importante é que esta produção seja posteriormente compartilhada com toda a comunidade escolar.

 Bibliografia

  • CORRÊA, Larissa Rosa. Abono de Natal: Gorjeta, prêmio ou direito? Trabalhadores têxteis e a Justiça do Trabalho. Esboços, vol. 13, nº 16, 2006.
  • LEAL, Murilo. A Reivenção da Classe Trabalhadora, São Paulo: Ed. Unicamp, 2011. 
  • NEGRO, Antonio Luigi. Desfazendo preconceitos sobre a história do Brasil. Revista Histórica. nº 05. 2005. 

1 Pesquisadora do LEHMT-UFRJ e Professora de História nas redes estadual e municipal de ensino no Rio de Janeiro
2 Pesquisador do LEHMT-UFRJ, Professor Adjunto de História da Universidade Estadual do Piauí – UESPI e Coordenador Acadêmico Local do Mestrado Profissional em Ensino de História – PROFHISTÓRIA



Crédito da imagem de capa: Festa de Natal do Grupo Votorantim (23/12/1944). Crédito: Memória Votorantim

Chão de Escola

Nos últimos anos, novos estudos acadêmicos têm ampliado significativamente o escopo e interesses da História Social do Trabalho. De um lado, temas clássicos desse campo de estudos como sindicatos, greves e a relação dos trabalhadores com a política e o Estado ganharam novos olhares e perspectivas. De outro, os novos estudos alargaram as temáticas, a cronologia e a geografia da história do trabalho, incorporando questões de gênero, raça, trabalho não remunerado, trabalhadores e trabalhadoras de diferentes categorias e até mesmo desempregados no centro da análise e discussão sobre a trajetória dos mundos do trabalho no Brasil.
Esses avanços de pesquisa, no entanto, raramente têm sido incorporados aos livros didáticos e à rotina das professoras e professores em sala de aula. A proposta da seção Chão de Escola é justamente aproximar as pesquisas acadêmicas do campo da história social do trabalho com as práticas e discussões do ensino de História. A cada nova edição, publicaremos uma proposta de atividade didática tendo como eixo norteador algum tema relacionado às novas pesquisas da História Social do Trabalho para ser desenvolvida com estudantes da educação básica. Junto a cada atividade, indicaremos textos, vídeos, imagens e links que aprofundem o tema e auxiliem ao docente a programar a sua aula. Além disso, a seção trará divulgação de artigos, entrevistas, teses e outros materiais que dialoguem com o ensino de história e mundos do trabalho.

A seção Chão de Escola é coordenada por Claudiane Torres da Silva, Luciana Pucu Wollmann do Amaral, Samuel Oliveira, Felipe Ribeiro, João Christovão, Flavia Veras e Leonardo Ângelo.

LEHMT

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