Chão de Escola #03: As reformas urbanas de Pereira Passos (1902-1906) e a formação dos subúrbios e da zona sul

Autor: Samuel Silva Rodrigues de Oliveira (Cefet-RJ)

Apresentação da atividade

Segmento: 2º Ano ou 3º Ano do Ensino Médio

Unidade temática: Reforma urbana de Pereira Passos

Objeto de conhecimento: Primeira República e história da cidade do Rio de Janeiro

Objetivos gerais:

– Caracterizar a reforma de Pereira Passos (1902-1906);

– Contextualizar as mudanças no cotidiano das classes populares na reforma urbana;

– Compreender a formação social dos “subúrbios” e da zona sul na cidade do Rio de Janeiro.

Duração da atividade: 03 aulas de 50 min

AulasPlanejamento
01Etapa 1 e 2
02Etapa 3, 4, e 5
03Etapa 6 e 7
04Etapa 8

Conhecimento prévio:

– A história da construção da cidadania no pós-abolição e na Constituição de 1891.

Atividade

Atividade e recursos:

Etapa 1: Leitura coletiva em sala de aula do texto 1 escrito por Marly Motta explicando o significado da expressão “bota-abaixo”. Procure identificar as palavras desconhecidas, construir um vocabulário de conceitos históricos e estabelecer os núcleos de sentido do texto.

Texto 1: O “BOTA-ABAIXO” Por Marly Motta

Expressão criada para designar, ao mesmo tempo, o processo de reformas urbanas operado a partir de 1903 no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, e o prefeito da cidade à época, Francisco Pereira Passos (1902-1906). Com a expressão “o Bota-Abaixo”, buscou-se destacar a maneira radical pela qual foi implementado um conjunto de obras públicas que então redefiniram a estrutura urbana da capital federal.
No início do século XX, o Rio de Janeiro era a principal e maior cidade do país. Os constantes fluxos migratórios e imigratórios favoreceram um intenso processo de urbanização, que demandava uma reestruturação espacial daquele que era considerado o cartão postal do país. Na base desse debate sobre a necessidade de um planejamento urbano – tanto no Rio quanto em Paris –, esteve presente o conceito de política higienista, relacionada com as precárias condições sanitárias das habitações urbanas, especialmente as coletivas. Uma das figuras preeminentes desse debate foi Pereira Passos, que entre 1857 e 1860 frequentou vários cursos na École de Ponts et Chaussées em Paris, onde acompanhou as obras empreendidas por Georges Haussmann com o intuito de transformar a capital francesa em uma cidade “civilizada”, de acordo com os padrões da época. À frente da prefeitura do departamento do Sena, Haussmann desbastou o emaranhado de ruas estreitas, pôs abaixo habitações populares, e construiu em seu lugar um conjunto monumental de largas e extensas avenidas.
Sanear, higienizar, ordenar, demolir, civilizar, foram também as palavras de ordem do prefeito Pereira Passos. Por isso mesmo, cortiços, casas de cômodos, estalagens, velhos casarões, passaram a ser os alvos preferenciais da reforma urbanística que empreendeu ao longo de seu mandato. Um dos objetivos principais dessa reforma era livrar a capital federal da pecha de cidade insalubre, assolada por constantes epidemias de febre amarela, varíola e malária, com sérios prejuízos para a atividade comercial do país.
À custa da derrubada de velhos imóveis, foram alargadas e prolongadas diversas vias urbanas, como a rua do Sacramento (futura avenida Passos), a rua da Prainha (atual rua do Acre) e a rua Uruguaiana, entre outras. Avenidas radiais e diagonais, cortando o centro em várias direções – as avenidas Mem de Sá, Salvador de Sá, Marechal Floriano – exigiram o arrasamento de morros, como o do Senado, e a demolição de moradias e casas de comércio que se encontravam no trajeto das “vias do progresso”.
A avenida Central (atual Rio Branco), que uniu o Rio de Janeiro de mar a mar, isto é, do porto, na Prainha, até a avenida Beira-Mar, é o marco principal da reforma urbana então realizada. Apesar de debitada ao prefeito, a obra foi iniciativa do governo federal, que ainda realizou obras de ampliação do porto do Rio de Janeiro, além de abrir as avenidas Rodrigues Alves e Francisco Bicalho.
São conflitantes as informações sobre o número de construções demolidas para dar passagem à nova avenida, variando entre setecentas e três mil. Ao atuar sobre velhas freguesias e distritos centrais, esse conjunto de intervenções urbanísticas resultou na destruição de quarteirões inteiros de hospedagens, cortiços, casas de cômodos e estalagens, além de armazéns e trapiches de áreas junto ao mar, forçando boa parte da população que aí vivia e trabalhava a se deslocar para os subúrbios ou a subir os morros próximos – Providência, São Carlos, Santo Antônio, entre outros –, até então pouco habitados.
Reconhecida como indispensável para o processo de remodelação urbana da capital federal, em especial pelos efeitos que teve sobre a circulação pelo Centro e sua ligação com outras zonas da cidade, a operação “bota-abaixo” ficou marcada pela maneira autoritária com que lidou com as milhares de pessoas prejudicadas pela perda de suas moradias e negócios.
Fonte: MOTTA, Marly. O “bota-abaixo”. Disponível em: http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/BOTA-ABAIXO,%20O.pdf

Etapa 2: Analise a tabela sobre a população do Rio de Janeiro, a distribuição no espaço urbano e faça o questionário relacionando-a com o texto 1 de Marly Motta.

Fonte: População do Rio de Janeiro apud OLIVEIRA, Samuel S.R., RENILDA, Maria. Cidade, assistência e saúde: maternidades entre o privado e o público no subúrbio do Rio de Janeiro. Delaware Review of Latin American Studies. Vol. 17, n.2, 2016.

Atividade

  1. Faça um gráfico em linha ou barra que mostre o crescimento da população total do Rio de Janeiro entre 1890 e 1950.
    1. Crie uma legenda para o gráfico que explique o crescimento populacional carioca.
  2. Identifique na tabela:
    1. A região da cidade mais densamente ocupada em 1890, e a menos ocupada;
    2. A região que mais cresceu entre 1890 e 1950;
  3. A reforma urbana de Pereira Passos realizou várias obras públicas no espaço da cidade do Rio de Janeiro. Cite as principais obras públicas realizadas no início do século XX.
  4. Explique o discurso que justificou a realização das obras públicas pelo prefeito Pereira Passos e os grupos que tiveram as condições de vida afetadas pelas transformações urbanas – caracterize os grupos em termos de classe e raça.
    1. Por que a reforma urbana de Pereira Passos ficou conhecida como “bota-abaixo”?
  5. Relacione distribuição da população nos espaços da cidade com a reforma urbana de Pereira Passos.

Etapa 3: Recupere as informações debatidas na etapa 1 sobre a reforma urbana de Pereira Passos e apresente os textos abaixo lendo-os coletivamente.

Texto 2

Outrora, nos tempos da velha cidade, o subúrbio era uma espécie de remanso feliz do proletário honesto, procurado em geral pelos pacíficos amantes do sossego e da tranquilidade.
Pobre, abandonado, pouco populoso, desprezado como sempre, possuindo apenas construções antigas, ruínas e pardieiros, vestígios de senzalas de extintas fazendas, mas dentro desses muros arruinados, esburacados, reinava a paz honesta e a pobreza sã.
E hoje?
Depois que o prefeito Passos os lançou por terra a velha cidade abrindo novas ruas e levantando novos edifícios, toda aquela pobre gente emigrou para o subúrbio e ahi (sic), foram vistas da justiça e da repressão, um grande mal que desenvolveu e progrediu. […]
E o mal progride, progride sempre horroroso e ameaçador sem que uma providência tenha sido tomada no sentido de evitá-lo ou melhorá-lo”
Fonte: FILHO, Affonso Cardoso. A perdição do subúrbio. Echo Suburbano. 1911. Adaptado.

Texto 3

A tendência aristocrática dos arrabaldes do Rio não fez senão aumentar no correr de meados do século XIX (…) a burguesia carioca, seguindo o exemplo de seus congêneres europeus que aqui residiam, começou a buscar novos espaços nos quais pudessem residir segundo os novos padrões europeus. Os arrabaldes do Rio de Janeiro, inclusive Niterói, devido à relativa proximidade às condições climáticas e à beleza natural, aos poucos perderam seu caráter bucólico de lazer, onde os mais ricos podiam construir belas residências secundárias e os menos abastados apenas desfrutar de um feriado ou um fim de semana. Os sítios e as chácaras eram loteados, ruas abertas, e a área se tornava assim, residencial e aristocrática por excelência.
Fonte: EL-KAREH, Almir Chaiban. Quando os subúrbios eram arrabaldes: um passeio pelo Rio de Janeiro e seus arredores no século XIX. In: 150 de subúrbio carioca. RJ:Editora UFF, 2009.p.31-32

Etapa 4: Faça uma roda de debates e solicite que os alunos discutam as questões abaixo, consultando e voltando ao texto e à tabela das etapas 1 e 2.

a) O texto 3 apresenta uma relação entre a “burguesia” e “aristocracia” do Rio de Janeiro com os espaços dos arrabaldes. Explique as motivações em meados do século XIX para se afastar do centro do Rio de Janeiro.
b) Identifique a autoria, data de publicação e meio de comunicação em que circulou o texto 2. Qual grupo social está sendo representado no texto?
c) O texto 2 aborda a reforma do prefeito Pereira Passos num viés crítico. Apresente as críticas apresentadas à reforma urbana. Por que o autor do texto apresenta críticas à reforma urbana?
d) Ambos os textos abordam a ocupação do espaço urbano dos arrabaldes/subúrbios do Rio de Janeiro. Aponte as diferenças e semelhanças entre os dois textos e faça um quadro comparativo.

Etapa 5: As duas fotografias abaixo mostram o cotidiano do bairro de Madureira. Solicite que o aluno escreva uma reportagem para o jornal Echo Suburbano e que tenha as duas imagens como referência e ilustração. A reportagem deverá fazer referência às reformas de Pereira Passos, usar dados estatísticos e informações históricas do início do século XX para interpretar as imagens.

Imagem 1

Fonte: Fotografia atribuída à Augusto Malta, representando o Mercado de Madureira. apud SANTOS, Myrian S (org.). Nos quintais do samba da Grande Madureira. RJ: Olhares, 2016.

Imagem 2

Fonte: Foto de Augusto Malta de bondes tracionados por animais em Madureira apud SANTOS, Myrian S (org.). Nos quintais do samba da Grande Madureira. RJ: Olhares, 2016.

Etapa 6: Leitura individual do texto do Lugares de Memória “Fábrica de Tecidos Aliança, Rio de Janeiro (RJ)” de Isabelle Pires, disponível no site do LEHTM: https://lehmt.org/2019/08/29/lugares-de-memoria-dos-trabalhadores-fabrica-de-tecidos-alianca-rio-de-janeiro-rj-isabelle-pires/.

Dialogue com a turma sobre os seguintes pontos:
– Como se caracteriza a “zona sul” no Rio de Janeiro na atualidade? Identifica-se o bairro de Laranjeiras e a zona sul como área industrial e operária?
– Qual a importância da Fábrica Aliança no final do século XIX e XX?
– Como o espaço urbano da região de Laranjeiras era ocupado por operários no início do século XX?
– Quais as transformações na densidade de ocupação dos bairros da orla, “zona sul” e “Botafo-Flamengo” após a reforma urbana de Pereira Passos? É possível abordar a elitização da “zona sul” a partir da reforma urbana do início do século XX?

Etapa 7: Analise a propaganda abaixo a partir do texto de Isabelle Pires e responda as questões abaixo.

Fonte: Anúncio publicitário do empreendimento imobiliário que foi edificado no local da Fábrica de Tecidos Aliança, após sua demolição. O Globo, 15/01/1945. Disponível em: https://lehmt.org/2019/08/29/lugares-de-memoria-dos-trabalhadores-fabrica-de-tecidos-alianca-rio-de-janeiro-rj-isabelle-pires/. Acesso em 18/06/2020.

Atividade

  1. O anúncio de venda de lotes apresenta em destaque a ideia de uma “cidade moderna”. Descreva o que é a modernidade na visão da propaganda.
  2. Identifique as práticas sociais e os grupos que foram silenciados na imagem, tendo em vista a ocupação da região de Laranjeiras no início do século XX.
    1. Pode-se afirmar que a elitização do bairro significou um “embranquecimento” da população local? Escreva um pequeno texto debatendo essa questão.
  3. Explique a posição da Companhia Textil Aliança Industrial na formação do espaço urbano de Laranjeiras.

Etapa 8: Atividade síntese e avaliativa. Divida a sala em grupos de quatro a seis estudantes, solicite a pesquisa e impressão duas fotos de cada região (centro, zona sul e subúrbio) na atualidade e oriente a construção de um mural coletivo. Para cada imagem, os grupos deverão escrever uma legenda explicando a relação da localidade/região retratada com a reforma urbana do Rio de Janeiro no início do século XX.

Bibliografia e material de apoio:


Crédito da imagem de capa: Fotografia atribuída à Augusto Malta, representando o Mercado de Madureira. apud SANTOS, Myrian S. (org.). Nos quintais do samba da Grande Madureira. RJ: Olhares, 2016.


Chão de Escola

Nos últimos anos, novos estudos acadêmicos têm ampliado significativamente o escopo e interesses da História Social do Trabalho. De um lado, temas clássicos desse campo de estudos como sindicatos, greves e a relação dos trabalhadores com a política e o Estado ganharam novos olhares e perspectivas. De outro, os novos estudos alargaram as temáticas, a cronologia e a geografia da história do trabalho, incorporando questões de gênero, raça, trabalho não remunerado, trabalhadores e trabalhadoras de diferentes categorias e até mesmo desempregados no centro da análise e discussão sobre a trajetória dos mundos do trabalho no Brasil.
Esses avanços de pesquisa, no entanto, raramente têm sido incorporados aos livros didáticos e à rotina das professoras e professores em sala de aula. A proposta da seção Chão de Escola é justamente aproximar as pesquisas acadêmicas do campo da história social do trabalho com as práticas e discussões do ensino de História. A cada nova edição, publicaremos uma proposta de atividade didática tendo como eixo norteador algum tema relacionado às novas pesquisas da História Social do Trabalho para ser desenvolvida com estudantes da educação básica. Junto a cada atividade, indicaremos textos, vídeos, imagens e links que aprofundem o tema e auxiliem ao docente a programar a sua aula. Além disso, a seção trará divulgação de artigos, entrevistas, teses e outros materiais que dialoguem com o ensino de história e mundos do trabalho.

A seção Chão de Escola é coordenada por Claudiane Torres da Silva, Luciana Pucu Wollmann do Amaral, Samuel Oliveira, Felipe Ribeiro, João Christovão, Flavia Veras e Leonardo Ângelo.

LEHMT

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