Livros de Classe #31: A invenção do trabalhismo, de Ângela de Castro Gomes, por Antônio Luigi Negro

No episódio de Livros de Classe desse mês, Antonio Luigi Negro, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), apresenta “A invenção do trabalhismo”, de Angela de Castro Gomes. Publicado no final dos anos 1980, o livro marcou o início de uma nova perspectiva de análise nas relações entre Estado e trabalhadores no período pós-1930, questionando as teorias que enfatizavam os processos de manipulação e cooptação. Por seu caráter inovador, “A invenção do trabalhismo” tornou-se um das principais referências no campo da história do trabalho no Brasil.

Livros de Classe

Os estudantes de graduação são desafiados constantemente a elaborar uma percepção analítica sobre os diversos campos da história. Nossa série Livros de Classe procura refletir justamente sobre esse processo de formação, trazendo obras que são emblemáticas para professores/as, pesquisadores/as e atores sociais ligados à história do trabalho. Em cada episódio, um/a especialista apresenta um livro de impacto em sua trajetória, assim como a importância da obra para a história social do trabalho. Em um formato dinâmico, com vídeos de curtíssima duração, procuramos conectar estudantes a pessoas que hoje são referências nos mais diversos temas, períodos e locais nos mundos do trabalho, construindo, junto com os convidados, um mosaico de clássicos do campo.

A seção Livros de Classe é coordenada por Ana Clara Tavares.

Contribuição Especial #26: O Quebra-quebra de 1983 e a luta dos trabalhadores desempregados


Edson Teles
Professor de Filosofia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)


Não se sabe ao certo o fato disparador das ações do quebra-quebra no dia 4 de abril de 1983. Duas ou três mil pessoas se reuniram no Largo 13 de Maio, no bairro de Santo Amaro, em São Paulo. Pediam emprego e pareciam sentir que seriam ouvidos em vista do processo de redemocratização. Cerca de três semanas antes, os primeiros governadores eleitos desde o golpe de 1964 haviam tomado posse. Em São Paulo fora eleito Franco Montoro, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), com a promessa de um governo participativo que respeitasse os direitos humanos.

Terminal de ônibus e centro comercial, o Largo 13 de maio era um espaço de referência fundamental na Zona Sul de São Paulo. Nas décadas anteriores, aquela área da cidade havia se tornado um dos principais polos da indústria moderna do país, com destaque para os setores metalúrgico e químico. Ao longo dos anos 1970, a região foi também um dos principais centros de mobilização e organização popular, com uma forte presença das comunidades eclesiais de base da Igreja Católica e de partidos de esquerda. Diversos movimentos sociais e a oposição sindical metalúrgica tinham na Zona Sul suas principais bases políticas.

O Largo 13 era o ponto semanal de finalização do extenuante périplo em busca de emprego. Às centenas, os desempregados percorriam as fábricas, de porta em porta, vindos dos extremos periféricos da região sul do município. Buscavam um trabalho nas placas de ofertas de vagas expostas junto ao portão das indústrias, que na maioria das vezes se encontravam vazias. Vivia-se num tempo de desemprego em massa e inflação diária significativa. A chamada crise da dívida abalava os alicerces do regime militar e provocava uma das maiores recessões da história do país, com terríveis efeitos sociais.

Aos domingos, normalmente, corriam boatos de que uma das fábricas estaria contratando trabalhadores na segunda-feira. Era o suficiente para as principais avenidas se assemelharem a pequenas passeatas de desempregados. Contudo, a crise econômica do país caminhava em outro sentido.

Naquela manhã ensolarada, os desempregados se transformaram em manifestantes e partiram em passeata. Alguns relatos falam de ações repressivas da Polícia Militar quando o grupo passava pela Administração Regional de Santo Amaro por volta das 8h50, o que teria sido o suficiente para explodir a revolta.

No retorno ao Largo, às 9h, os manifestantes saquearam o supermercado Barateiro. Em 10 minutos, o cenário do protesto transformara-se num levante popular. Mas ainda não estava claro que aquele não seria mais um protesto contra o desemprego e o alto custo de vida. A repressão, um discurso inflamado, a movimentação da passeata, o cansaço da repetição.

Largo 13 de maio no 4 de abril de 1983, antes de começar o Quebra-quebra. Fonte: Folha de S. Paulo 05041983

Uma das principais ações do quebra-quebra foi o saque. A força ingovernável da multidão em revolta não podia ser contida, ganhando o caráter da insurreição e da esperança. Instalou-se o conflito entre manifestantes em revolta e policiais militares nas ações de repressão. A linguagem era a da violência. Mas no intervalo dos atos antagônicos, o espírito do dia seguia a quebra das normas e do cotidiano. Já no período da tarde, entre um tumulto e outro, a PM formava cordões visando dispersar as aglomerações.

Até a hora do almoço, a situação já estava fora do controle de qualquer instituição, liderança ou polícia. Pelo menos três supermercados, além de vários pequenos e médios comércios, haviam sido saqueados, e vários ônibus foram quebrados. Com paus e pedras, os revoltosos enfrentavam a ação violenta da Polícia Militar, que avançava com golpes de cassetete, bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral e tiros para o alto. Entre as 15h e as 16h, quando tudo parecia acalmar-se, um comício com cerca de 1.000 pessoas se formou e uma passeata saiu em direção à Assembleia Legislativa.

Manifestações em diversos pontos, duas passeatas (uma em direção à Assembleia Legislativa e, outra, para a porta do 11ª. Delegacia de Polícia, visando soltar os presos da manhã) e os saques. O supermercado Barateiro, à rua Herculano de Freitas, já se encontrava com as prateleiras esvaziadas. Em meio ao caos organizador da revolta, o deputado federal Aurélio Peres (PMDB, mas ligado ao então clandestino PCdoB) propunha, de cima de um veículo com equipamento de som, a formação de uma comissão de negociação para discutir junto ao governo do Estado a formação de frentes de trabalho emergenciais. A reunião se daria no dia seguinte, dentro do Palácio dos Bandeirantes.

As ruas da região estavam bloqueadas, seja por manifestantes e suas improvisadas barricadas, seja por tropas da Polícia Militar. Nesses pontos, se via um contínuo fluxo de vai e vem de ambos os lados, como se houvesse uma disputa por aqueles metros do campo de batalha. Pequenos grupos, mas decididos, jogavam  pedras e paus e xingavam os policiais. Ao mesmo tempo, lojas voltaram a ser saqueadas e diversos pontos da região.

No fim da tarde, o grupo principal que se dirigiu à Assembleia Legislativa, após tentar ocupar o prédio, foi recebido por parlamentares em um plenário da casa legislativa. Ao final do encontro, sem obter algo de concreto, o grupo se dirigiu à avenida, cercou e tomou quatro ônibus que circulavam e, com eles, se dirigiram aos bairros da Zona Sul, ponto de partida da revolta.

À noite, novos saques e protestos alimentavam o cenário de batalha. Das 18h em diante, num efeito cascata, a revolta se alastrou para outros bairros mais profundos da Zona Sul da cidade: Jardim São Luiz, Jardim Angela, Parque Santo Antônio, Estrada de Itapecerica, Jardim Monte Azul, Figueira Grande, Piraporinha, Vaz de Lima, entre outros bairros e localidades. Em vários pontos se ouviam os gritos: “temos fome, temos fome”. Os carros da Polícia Militar passaram a circular em grupos, receosos de se tornar alvos, e uma viatura do serviço de trânsito foi virada. Vários veículos da polícia foram apedrejados. Quando viaturas se deslocavam para um ponto com um episódio de saque, rapidamente o lugar se esvaziava, e outro local era atacado.

O dia 4 de abril terminaria com perspectivas grandes para o dia seguinte: uma nova manifestação marcada para o Largo 13 de Maio, às 8 horas, com passeata em direção ao Palácio dos Bandeirantes. E, no período da tarde, previa-se a reunião dos três governadores da oposição, Franco Montoro (PMDB), Tancredo Neves (PMDB) e Leonel Brizola (PDT), para o mesmo Palácio.

O segundo dia da revolta se iniciou sob forte tensão. Os protestos, saques e conflitos com as “tropas da ordem” se estenderam por outras regiões da cidade e a passeata principal entrou em batalha campal nos jardins do Palácio dos Bandeirantes. Um saldo de mais de 300 prisões e um morto a tiro é apenas um aspecto do aumento da revolta.

Logo pela manhã uma passeata com mais de 1.000 pessoas saiu do Largo 13 de Maio e se dirigiu ao Palácio de Governo. Enquanto isso, em Santo Amaro, a PM batia em todos. Gritava-se: “Um, dois, três, quatro, cinco mil, ou para o desemprego, ou paramos o Brasil” e “Chora Figueiredo, Figueiredo chora, chora Figueiredo que chegou a sua hora”, entre outras, entre outras.

Na passeata em direção ao Palácio dos Bandeirantes a confusão política se estabeleceu. Lideranças sindicais e Polícia Militar às vezes se chocavam, outras vezes se encontravam na tentativa de conter os revoltosos. Às 11h, os primeiros manifestantes estavam em frente ao Palácio. Impacientes, os revoltosos derrubaram mais 100 metros de grades e entraram em conflito com a Tropa de Choque durante as duas horas seguintes. No jardim, a PM distribuía pancadas e bombas, enquanto os manifestantes gritavam “agora eu quero ver o Montoro receber”.

Exigia-se uma reunião com o governador, que de fato ocorreu depois da ocupação, às 12h50, acalmando os ânimos e abrindo um canal de diálogo. Enquanto governo e a comissão de representantes conversavam, populares arremessavam pedras contra vidraças das mansões do Morumbi, bairro onde se localiza a sede do governo. Somente às 14h20, em ônibus fornecidos pelo Estado, é que os manifestantes começam a sair, diante da promessa de respostas num encontro a ser realizado no dia seguinte.

No terceiro e último dia de revolta, São Paulo amanheceu fortemente militarizada. Ainda assim houve choques generalizados na Praça da Sé, com conflitos que se seguiram por praticamente cinco horas e atingiram toda a região central da cidade, cujo comércio permaneceu o dia inteiro fechado. Na esfera institucional, ocorreu uma reunião agendada pela comissão de diálogo e o governo. Nesta segunda oportunidade, a comissão já se encontrava com composição modificada, pois nem todos que estiveram no Palácio dos Bandeirantes na terça-feira foram convidados para a conversa da quarta-feira. E o governo ainda convidou alguns sindicalistas que foram prestar solidariedade ao governador, o que gerou atrito com a comissão de desempregados. Estes esperavam respostas para suas reivindicações do dia anterior, como a criação de um salário desemprego, passe livre no transporte para o trabalhador procurar emprego, abertura de vagas em obras públicas e gestão junto aos empresários para congelar as demissões em massa, libertação dos presos, entre outras propostas.

Os protestos e saques ecoaram nos meses seguintes, mas a militarização e o discurso do consenso impuseram aos poucos o silêncio em torno da revolta. O ano de 1983 respiraria a atmosfera da revolta: veria os protestos vulcânicos serem asfixiados pela repressão estatal e o controle político ser retomado pelas forças autorizadas.

Os chamados “boatos”, no entanto, se seguiram, assim como protestos e tentativas de saques, provocando o fechamento do comércio e correrias em alguns locais de São Paulo e em cidades do interior (São Bernardo do Campo, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Sorocaba, Campinas, Piracicaba e Jundiaí). Em Santos, por boa parte do período da tarde, todo o comércio do Centro, praia e bairros ficou fechado devido a ameaças de manifestações.

Na cidade do Rio de Janeiro, por volta da hora do almoço da quinta-feira, dia 07 de abril, algumas dezenas de pessoas saquearam um supermercado no bairro de periferia Bangu. Mais tarde, nos bairros de Campo Grande e Santa Cruz ocorreram tentativas de saques ao comércio. Na sexta-feira, foi a vez de Fortaleza, com saques a lojas comerciais, provocando conflitos com a Polícia Militar, que lançou bombas e prenderam manifestantes.

Aos poucos, se impôs o silêncio à revolta. Ainda não se estabelecera a hegemonia das ruas, mas o processo de transição preparava o terreno para que não se perdesse o controle sobre elas. Para a oposição ocupar espaço institucional era necessária a abertura a novos atores e a novas formas de lidar com os conflitos sociais e os debates sobre como seria a nascente democracia. Nas disputas das ruas e no esforço para esvaziá-las de seu caráter de revolta e protesto se construiu a lógica da governabilidade.

Por outro lado, as ruas continuaram a fazer parte das disputas sobre qual democracia viria. Assim ocorreu na Greve Geral de julho de 1983 que, juntamente com outras manifestações do movimento sindical e dos movimentos sociais, fomentou uma das maiores campanhas populares e de rua da história do país, que exigia eleições Diretas Já. Sim dúvida todo esse percurso de lutas populares teve seu ponto alto no processo constituinte que gerou a Constituição de 1988.

 Comissão de representantes do Desempregados, montada no calor da hora, em reunião com o Secretário do Trabalho, Almir Pazzianotto. Fonte:  Estado 06041983


PARA SABER MAIS:

EMBÓN, Daniela; PORTES, Katia. 1983 – Santo Amaro saqueada. Vídeo-documentário. São Paulo: Coletivo Memoriedades, 2022, 57 min.

FERREIRA, Cassiana Buso. Representações de intolerância na imprensa escrita: saques e quebra-quebras em São Paulo (abril de 1983). Tese de Doutorado. São Paulo: USP, 2009.

SILVA, Matheus. Queremos comida, quem vai dar? O motim de 1983 contra a fome e o desemprego em São Paulo. Dissertação de mestrado. São Paulo: PUC, 2018.

TELES, Edson. “A revolta da fome: notícias sobre o quebra-quebra de abril de 1983 e a fabricação do consenso político”. In: revista Antropolítica, v.54, n.2, Niterói/RJ: UFF, mai/ago 2022, pp. 22-51.


Crédito da imagem de capa: Manifestantes derrubando as grades do Palácio dos Bandeirantes, no dia 05 de abril de 1983. Fonte: Derrubando_Estado 06041983

Artigo “Escola Técnica Nacional: história oral, memória e cotidiano de uma instituição escolar (1942- 1964)” – Samuel Oliveira, Maria Barreto e Tereza Fachada


O artigo foi publicado na Revista Brasileira de História da Educação por Samuel Oliveira, Maria
Renilda Barreto e Tereza Fachada, e aborda a memória social de estudantes da Escola Técnica
Nacional (ETN).

Criada em 1942, durante o Estado Novo (1937-1942), a ETN tinha o propósito de oferecer uma
educação industrial para famílias operárias e formar “trabalhadores nacionais” afinado com as
ideologias desenvolvimentistas e industrialistas. O artigo explora as relações de gênero e
classe nas memórias dos ex-alunos(as), e a forma como a trajetória profissional e as ideias
sociais foram marcados pela educação técnica.

O texto é o resultado de uma pesquisa que analisou as relações constitutivas do mundo do
trabalho no cotidiano de uma instituição escolar marcada pelos ideais de Getúlio Vargas.

Link: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/60985

Chão de Escola #30: professora Keila Grinberg fala sobre os 20 anos da Lei 10.639/03


Olá, professora Keila Grinberg, é um prazer receber você no CHÃO DE ESCOLA. Além da liderança e destaque na análise da história social e política do Império no Brasil e do cativeiro e da liberdade no século XIX, você se destaca pela produção de livros didáticos para a educação básica, pelo projeto de história pública Passados Presentes, e pela formação de professores na universidade e através do ProfHistória. Esse empenho como pesquisadora e na educação básica distingue sua trajetória. E gostaríamos de saber o que você considera importante para um professor de História exercer seu ofício? Quais seriam as habilidades importantes de serem desenvolvidas?

Obrigada pelas perguntas sobre a minha trajetória. Para mim, a atuação na educação básica, no ensino superior e na pesquisa nunca foram atividades dissociadas. Para um professor de História exercer seu ofício, fundamental é ter condições para tal, que começam com salário digno e plano de carreira, mas não só: é poder se dedicar à preparação das aulas sem ter que correr de uma escola para outra, é poder trabalhar sem constantes ameaças. Nos últimos anos os professores (não só de História, mas os de História foram, por razões evidentes, especialmente visados) vem sofrendo demais com a falta de segurança para desenvolver suas aulas. Nas aulas de História, principalmente de História do Brasil, abordamos temas difíceis para os professores e para os alunos. É preciso garantir que os professores tenham tranquilidade para se dedicar a esta tarefa dura, e ao mesmo tempo fascinante, que é aprender e ensinar a pensar historicamente. Sobre as habilidades, acho que elas se resumem basicamente em uma: escuta. É preciso escutar os estudantes. Claro que esta habilidade não é exclusiva dos professores de História, mas eu acho que é particularmente importante para nós. Trabalhar com História exige sensibilidade, cautela, e sobretudo um olhar atento para ouvir quem está na sala de aula. Esta disposição em escutar e prestar atenção permite que os professores saiam da posição de autoridade, de detentores absolutos do conhecimento, e possam investir num diálogo aberto com seus alunos, fundamental no processo de aprendizagem. Mas nada disso é possível sem a garantia de segurança e tranquilidade para desenvolver o próprio trabalho.

O mestrado profissional em História  foi criado em 2013 e tem sido um marco importante para a área. Como o ProfHistória, da qual você foi vice-coordenadora local e nacional entre 2014 e 2017, afeta a formação dos professores?

Eu tenho o maior orgulho de ter feito parte do grupo que discutiu a criação do PROFHISTORIA e de ter estado na coordenação do Programa com a Marieta de Morais Ferreira nestes primeiros anos. O PROFHISTORIA é a iniciativa mais importante da pós-graduação em História dos últimos anos, por tantos motivos: ele possibilita a integração da Educação Básica com o Ensino Superior, a circulação do conhecimento produzido na escola com aquele produzido na universidade, tem um impacto imediato na formação dos alunos da Educação Básica. Todos os PROFs – os programas de mestrado profissional dedicados ao ensino de disciplinas escolares – têm estes aspectos em comum. Nós, na História, nos dedicamos muito a enfrentar as complexidades e os desafios da construção de um programa em rede, que envolve a discussão de conteúdos, abordagens, metodologias, em escala nacional.

A história social do trabalho tem passado por profunda transformação nas últimas décadas. Na sua avaliação, essa renovação tem chegado aos livros didáticos e nas discussões curriculares?

Acredito que a renovação dos temas da história social do trabalho esteja chegando nos livros didáticos, sempre mais devagar do que gostaríamos; mas se formos comparar os livros didáticos dos últimos trinta, quarenta anos, vamos ver uma grande diferença não só nos temas abordados, mas também na maneira como eles entram nos currículos. Um dos elementos importantes desta renovação são as questões das provas de ingresso nas universidades; questões criativas, que abordam o conteúdo de forma inovadora, propiciam discussões importantes, pelo menos nos últimos anos do Ensino Médio. Mas hoje é impossível pensar em renovação curricular e incorporação de novos temas e abordagens sem levar em consideração a proposta de mudança curricular do Ensino Médio, que em larga medida afeta a capacidade dos professores de incorporar e desenvolver estes temas. É preciso entender que o novo (sic) Ensino Médio altera profundamente o ensino de disciplinas como a História (aliás, também do Ensino Fundamental).

Uma das mudanças do campo da história social do trabalho e da escravidão no Brasil é uma aproximação das experiências constituídas no Império e na República. Como você percebe isso na escrita de livros didáticos e nos projetos de história pública a que se vincula?

Acho que um dos principais ganhos do ingresso das temáticas da história social do trabalho nas salas de aula é a possibilidade de pensar o processo histórico a partir das experiências da maioria da população, da História “vista de baixo”, para usar uma expressão clássica e já datada. Esta é uma discussão já bem antiga, mas para muitos dos estudantes, o processo histórico é ainda é uma sucessão de grandes acontecimentos, liderados por homens (o gênero é fundamental aqui) que ocuparam cargos de liderança e destaque. A perspectiva da história social permite a quebra deste paradigma. No caso da história social do trabalho (a escravidão aí incluída) do Império e da República, tentar compreender as experiências das pessoas que viveram esta época nos permite abordar momentos fundamentais da História do Brasil, como a abolição da escravidão e a proclamação da República, de maneira totalmente diferente da perspectiva tradicional. Há muito tempo que não há mais como trabalhar a abolição da escravidão (tanto nos livros didáticos, como em projetos dirigidos para o grande público) como sendo obra da Família Imperial. Esta perspectiva é adotada há muito tempo nas salas de aula, mas a onda conservadora dos últimos anos, que insiste em promover uma perspectiva hierárquica da História do Brasil, vem desafiando os professores de todos os níveis aprofundar a discussão de temas que até pouco tempo atrás nos pareciam óbvios. A história social do trabalho produz ferramentas metodológicas importantíssimas para se pensar a história do Brasil de maneira a compreender nossas questões estruturais, como a permanência das desigualdades e do racismo, mas também a romper com a naturalização destas questões: nossa sociedade não é fadada a ser hierárquica, desigual, racista.

Em 2023, temos a efeméride de  20 anos da Lei 10.639/03. Qual a importância desse regulamento na renovação do ensino em História?

A lei 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira, depois complementada pela lei 11645 de 10 de março de 2008, que inclui também a história indígena, está para o ensino de História em particular como as cotas estão para a educação em geral: promoveram uma mudança de tamanha grandeza, que não há onda conservadora que faça voltar atrás. Efemérides criam boas oportunidades para reflexões como esta, e felizmente neste ano de 2023 teremos condições de voltar a aprofundar as discussões sobre o tema. Para falar dos vinte anos da lei 10.639/03, é fundamental começar pelas décadas de mobilização dos movimentos sociais, principalmente do movimento negro, para que ela virasse realidade. Sem pressão destes grupos, não haveria lei. O que ela propiciou, para além da noção – nem sempre fácil de mensurar —  de obrigatoriedade da introdução destes temas nos currículos de História, foi a discussão pública sobre a centralidade da experiência dos africanos e seus descendentes e da população indígena para compreender a história do Brasil. Do ponto de vista concreto, a lei forçou a revisão dos livros didáticos, a promoção de cursos de especialização para professores da Educação Básica, a inclusão de disciplinas de História da Africa e de Cultura Afro-Brasileira nas universidades, a formação de professores especialistas no tema. A lei também foi importante para, junto com outros elementos, provocar o debate sobre cor, racialização e branquitude entre nós, historiadores. Basta ver a importância que o GT de Pós-Abolição e da rede de Historiadorxs Negrxs. O protagonismo dos professores-pesquisadores brasileiros neste campo, aliás, tem impacto internacional: no campo da História Afro Latino Americana, que vem se desenvolvendo com força nos últimos anos nos Estados Unidos e em toda a América Latina, o Brasil vem desempenhando um papel importante, não só do ponto de vista numérico (somos muitos), mas também por produzir uma reflexão original, criativa, sensível e relevante sobre o tema. É impossível estudar a experiência negra e indígena na história das Américas sem levar em conta a produção brasileira sobre o tema.


Keila Grinberg é professora titular licenciada do Departamento de História da UNIRIO, autora de livros didáticos, uma das fundadoras do ProfHistória e especialista na História da escravidão e do pós-abolição. Ela destaca-se na discussão e debate sobre o ensino de História no Brasil, com engajamento em projetos de história pública que discutem a Lei 10.639/03. Atualmente é diretora do Center for Latin American Studies e professora titular do departamento de História da University of Pittsburgh.


Crédito da imagem de capa: Primeira Marcha Zumbi – Foto: Geledés Instituto da Mulher Negra /Rede de Historiadores Negros /Acervo Cultne.


Chão de Escola

Nos últimos anos, novos estudos acadêmicos têm ampliado significativamente o escopo e interesses da História Social do Trabalho. De um lado, temas clássicos desse campo de estudos como sindicatos, greves e a relação dos trabalhadores com a política e o Estado ganharam novos olhares e perspectivas. De outro, os novos estudos alargaram as temáticas, a cronologia e a geografia da história do trabalho, incorporando questões de gênero, raça, trabalho não remunerado, trabalhadores e trabalhadoras de diferentes categorias e até mesmo desempregados no centro da análise e discussão sobre a trajetória dos mundos do trabalho no Brasil.
Esses avanços de pesquisa, no entanto, raramente têm sido incorporados aos livros didáticos e à rotina das professoras e professores em sala de aula. A proposta da seção Chão de Escola é justamente aproximar as pesquisas acadêmicas do campo da história social do trabalho com as práticas e discussões do ensino de História. A cada nova edição, publicaremos uma proposta de atividade didática tendo como eixo norteador algum tema relacionado às novas pesquisas da História Social do Trabalho para ser desenvolvida com estudantes da educação básica. Junto a cada atividade, indicaremos textos, vídeos, imagens e links que aprofundem o tema e auxiliem ao docente a programar a sua aula. Além disso, a seção trará divulgação de artigos, entrevistas, teses e outros materiais que dialoguem com o ensino de história e mundos do trabalho.

A seção Chão de Escola é coordenada por Claudiane Torres da Silva, Luciana Pucu Wollmann do Amaral e Samuel Oliveira.

LMT #121: União dos Operários da Construção Civil do Rio de Janeiro (RJ) – Eduardo de Oliveira


Eduardo de Oliveira
Doutor em História, Política e Bens Culturais pelo CPDOC-FGV


A União dos Operários da Construção Civil do Rio de Janeiro, fundada em 1915 ainda como União Geral da Construção Civil (UGCC), foi uma importante associação de trabalhadores cariocas na Primeira República. De orientação anarquista, protagonizou greves e protestos, bem como enfrentamentos com a polícia, especialmente entre 1919 e 1922. Neste período, em que a UOCC anunciava ter 14 mil associados, confrontos ocorreram em diferentes pontos da cidade mas, principalmente, nas duas sedes que a entidade ocupou neste período. Em pouco menos de três anos, forças de segurança invadiram e fecharam as sedes da União por quatro vezes. 

A mobilização cresceu bastante a partir de 1917, com a participação na chamada “greve geral”, e também devido à comoção causada pelo desabamento de um hotel em obras, acidente que provocou a morte de 40 trabalhadores e deixou pelo menos 20 feridos. Em 1919, a UGCC seria rebatizada como União dos Operários da Construção Civil, já então congregando milhares de pedreiros, carpinteiros, pedreiros, estucadores, ladrilheiros, pintores e ajudantes. Naquele ano o presidente da entidade era o português José Madeira, pintor, que também fazia parte da diretoria da Federação Operária do Rio. Desde 1917 já havia sido preso ao menos cinco vezes, sendo por isso conhecido pela polícia como “agitador anarquista”.

A primeira sede da UOCC funcionou no primeiro andar de um sobrado, no número 231 da Praça da República, em um quarteirão desaparecido nos anos 1940, com a abertura da Avenida Presidente Vargas. Foi em frente àquele sobrado que, em 9 de setembro de 1919, cerca de 600 operários se concentraram em um protesto, motivado pela apreensão do jornal anarquista Spártacus. Das janelas do primeiro andar, oradores faziam discursos inflamados, também ouvidos à distância por 50 policiais que compareceram ao local sob o comando do delegado Nascimento Silva.


No térreo do sobrado funcionava uma cervejaria, onde manifestantes ergueram uma barricada com mesas e cadeiras. Os policiais foram recebidos por uma “chuva” de garrafas, copos e pedras, mas conseguiram dispersar a multidão – além de efetuar 35 prisões e fechar a sede.  Um mês depois, José Madeira seria deportado, bem como outros militantes portugueses e espanhóis.


Pouco tempo depois, a União inaugurou uma nova sede, também próxima à Central do Brasil, na rua Barão de São Félix. E em 16 de junho de 1920, ali ocorreu outra operação policial, motivada por uma denúncia anônima. O Rio vivia então uma onda de atentados a bomba (19 delas já haviam explodido naquele ano, deixando 8 feridos) e a denúncia informava que havia material explosivo na União. Com efeito, a polícia alegrou haver encontrado duas bombas. Além delas também teriam sido apreendidas armas, publicações anarquistas, estopins e pólvora. Ao menos 17 associados foram presos.

Foram apreendidos ainda curiosos instrumentos de protesto: lâmpadas e ovos, cuidadosamente esvaziados e preenchidos com piche. Há alguns dias estas “bombas” vinham sendo atiradas em paredes de imóveis em construção na Esplanada do Senado. A “pichação” era uma forma de protesto contra prazos reduzidos e longas jornadas de trabalho dos pedreiros e também um alerta para colegas que não aderissem a greves.

Pichações na esplanada do Senado, em junho de 1920, foram o motivo alegado para a abertura de um inquérito policial que requeria o fechamento da União por tratar-se de um “centro de propaganda subversiva, sob a máscara de associação de classe”. Na manhã de 8 de fevereiro, terça-feira de Carnaval, a polícia agiu. Aproximadamente 50 agentes cercaram a sede da UOCC e quarteirões adjacentes. Houve um rápido conflito (três feridos) e duas prisões. A porta do sobrado estava fechada e, de início, os policiais não conseguiram entrar no imóvel. Das sacadas do primeiro andar, operários zombaram deles. Mas uma escada Magirus foi levada ao local: os operários conseguiram fugir pelas janelas dos fundos enquanto os policiais entravam pelas janelas da frente. Na sede da UOCC a polícia encontrou armas, material explosivo e centenas de panfletos de propaganda revolucionária. Como a sede estava vazia, ninguém foi detido no local – mas a polícia varejou lojas e botequins nas imediações, efetuando 25 prisões.

Proibidos de se reunir, associados da União passaram a organizar encontros clandestinos, embora suas convocações fossem anunciadas nos jornais em código. Somente em 1922 a UOCC iria reabrir suas portas. E, antes de o ano acabar, informou claramente seus objetivos, através de um comunicado, publicado em novembro: “Esta associação declara por meio da imprensa que não abandona os meios de ação direta, revolucionária, anarquista que continua no seu programa”. A declaração era especialmente perigosa para a União, dado que já vigorava o mandato do presidente da República Arthur Bernardes, herdeiro e continuador de um estado de sítio. Os jornais cariocas, censurados, omitiam a repressão da polícia.

Em 1924, a União dos Operários da Construção Civil iria novamente trocar de endereço, retornando à Praça da República. E nos anos seguintes ocuparia outras sedes, sempre no Centro. Atravessando períodos de maior ou menor repressão, iria mudar seus meios de luta – abandonando a “ação direta” e os enfrentamentos com a polícia, tendo sobrevivido pelo menos até o Estado Novo, em 1937. O pacato sobrado na Barão de São Félix, onde hoje funciona uma barbearia, sobrevive como endereço da memória de um tempo de enfrentamento e perseguição, mas também de resistência e mobilização.

A Praça da República, no início do século XX: bem perto da Central do Brasil e do QG do Exército ficava a sede do UOCC, em um quarteirão que desapareceu nos anos 1940, com a abertura da Avenida Presidente Vargas. Foto de Augusto Malta. Acervo do Instituto Moreira Sales


Para saber mais:

  • BATALHA, Cláudio. O movimento operário na Primeira República. Rio de Janeiro: Zahar 2000.
  • CHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores brasileiros na Belle Époque. Campinas: Unicamp, 2011.
  • DULLES, John W.F. Anarquistas e comunistas no Brasil – 1900-1935. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977.
  • FAUSTO, Boris. Trabalho urbano e conflito social (1890-1920). São Paulo: Difel, 1976. MARAM, Sheldon. Anarquistas, imigrantes e o movimento operário brasileiro – 1890-1920. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

Crédito da imagem de capa: Matéria sobre os conflitos entre a polícia e a UOCC no jornal A Razão, 20 de janeiro de 1921.


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Lugares de Memória dos Trabalhadores

As marcas das experiências dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros estão espalhadas por inúmeros lugares da cidade e do campo. Muitos desses locais não mais existem, outros estão esquecidos, pouquíssimos são celebrados. Na batalha de memórias, os mundos do trabalho e seus lugares também são negligenciados. Nossa série Lugares de Memória dos Trabalhadores procura justamente dar visibilidade para essa “geografia social do trabalho” procurando estimular uma reflexão sobre os espaços onde vivemos e como sua história e memória são tratadas. Semanalmente, um pequeno artigo com imagens, escrito por um(a) especialista, fará uma “biografia” de espaços relevantes da história dos trabalhadores de todo o Brasil. Nossa perspectiva é ampla. São lugares de atuação política e social, de lazer, de protestos, de repressão, de rituais e de criação de sociabilidades. Estátuas, praças, ruas, cemitérios, locais de trabalho, agências estatais, sedes de organizações, entre muitos outros. Todos eles, espaços que rotineiramente ou em alguns poucos episódios marcaram a história dos trabalhadores no Brasil, em alguma região ou mesmo em uma pequena comunidade.

A seção Lugares de Memória dos Trabalhadores é coordenada por Paulo Fontes.

Resenha “Uma febre dançante no Rio de Janeiro: cultura negra e associativismo recreativo” – Isabelle Pires


A resenha intitulada “Uma febre dançante no Rio de Janeiro: cultura negra e associativismo recreativo” foi escrita por Isabelle Pires, doutoranda do PPGHIS/UFRJ e pesquisadora do LEHMT/UFRJ, e aborda o livro A cidade que dança, do professor Leonardo Pereira (PUC-Rio).

Publicado na revista Mundos do Trabalho, o texto destaca a relevância da obra por analisar os clubes dançantes constituídos por trabalhadores/as negros/as entre 1881 e 1933 como espaços de lazer atrelados à defesa da cidadania, à valorização da negritude e da cultura negra e à legitimidade de uma marca social singular.

A resenha está disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/mundosdotrabalho/article/view/86542/52291

Vozes Comunistas #22: Álvaro Ventura



“Vozes comunistas” é uma série especial do Vale Mais, podcast do LEHMT/UFRJ. Entre março de 2022 e março de 2023 homenageamos o centenário do Partido Comunista Brasileiro (PCB) com a divulgação do áudio de 22 trechos de entrevistas de antigos sindicalistas, lideranças operárias e camponesas ou mesmo trabalhadores/as de base que contam um pouco da história do PCB e sua importância para a história do trabalho no Brasil.
Em nosso último episódio, apresentamos trechos de uma entrevista realizada em 1984 com Álvaro Ventura, líder sindical dos estivadores de Santa Catarina. Anarquista em sua juventude, Ventura iniciou sua militância política muito cedo. Nos anos 1920, filiou-se ao PCB. Presidiu a União dos Operários Estivadores de Florianópolis e teve intensa atuação no movimento sindical de Santa Catarina. Foi deputado federal classista entre 1933 e 35. Preso após o levante da ANL em 1935, foi para a clandestinidade. Entre 1943 e 45, foi o secretário-geral do partido.
No trecho que ouviremos, Álvaro Ventura fala de sua esperança na juventude e no futuro da luta anti-imperialista e pelo socialismo no Brasil e no mundo. Esta voz comunista é apresentada pelo jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar.

Projeto e execução: Ana Clara Tavares, Felipe Ribeiro, Larissa Farias e Paulo Fontes
Apoio: Centro de Documentação e Imagem da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Agradecemos às instituições e pesquisadores que gentilmente colaboraram com nosso projeto

Referência da entrevista: Entrevista Álvaro Ventura. 12 de fevereiro de 1984. Entrevistadores: Edgar Carone, Maurício Tragtenberg, José Maria Crispim, Ana Lucia Goulart de Farias, Regiane Cruz, João Ventura e Sérgio Gomes da Cruz. Centro de Memória Sindical.

Vale Mais #32: Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson, por César Queirós e Marcos Braga Vale Mais

Está no ar o quinto episódio da nova temporada do podcast Vale Mais, do LEHMT-UFRJ! Nesta temporada, convidamos pesquisadoras e pesquisadores para discutir projetos, livros e teses recentes que aprofundam debates interdisciplinares sobre os mundos do trabalho. Neste quinto episódio, conversamos com César Queiroz, professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e Marcos Braga, professor da rede pública estadual de educação do Amazonas e doutorando do programa de pós-graduação em História da UFAM. Os convidados são organizadores do livro Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson. A obra é produto da disciplina “Trabalho e movimentos sociais na Amazônia”, oferecida no PPGH/UFAM, em 2024, em homenagem ao centenário de Edward Thompson, sendo o foco do curso debater as contribuições thompsonianas e as polêmicas que o envolveram ao longo de sua vida. Os/as alunos/as da disciplina elaboraram verbetes que fazem parte da composição desta breve dicionário. Não deixe também de compartilhar e acompanhar os próximos episódios! Entrevistadores: Ana Clara Tavares, Isabelle Pires, Josemberg Araújo, Larissa Farias e Thompson Clímaco Roteiro: Ana Clara Tavares, Isabelle Pires, Larissa Farias e Thompson Clímaco Produção: Ana Clara Tavares e Larissa Farias Edição: Josemberg Araújo e Thompson Clímaco Diretor da série: Thompson Clímaco Coordenadora geral do Vale Mais: Larissa Farias
  1. Vale Mais #32: Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson, por César Queirós e Marcos Braga
  2. Vale Mais #31: Saraiva, Dantas e Cotegipe: baianismo, escravidão e os planos para o pós-abolição no Brasil, por Itan Cruz
  3. Vale Mais #30: A cultura de luta antirracista e o movimento negro do século 21, por Thayara Lima
  4. Vale Mais #29: The Second World War and the Rise of Mass Nationalism in Brazil, por Alexandre Fortes
  5. Vale Mais #28: O poder e a escravidão, por Bruna Portella e Felipe Azevedo

Livros de Classe #30: A Tecelagem dos Conflitos de Classe, de José Sérgio Leite Lopes, por Paulo Fontes

No primeiro episódio da terceira temporada de Livros de Classe, Paulo Fontes, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e coordenador do LEHMT-UFRJ, apresenta a obra A Tecelagem dos Conflitos de Classe na Cidade das Chaminés, de José Sérgio Leite Lopes. Fontes argumenta que o livro teve um papel fundamental na renovação dos estudos sobre a história do trabalho no século XX, redefinindo debates sobre o processo de industrialização, dominação empresarial, formação de classe e habitação operária, entre outros.

Livros de Classe

Os estudantes de graduação são desafiados constantemente a elaborar uma percepção analítica sobre os diversos campos da história. Nossa série Livros de Classe procura refletir justamente sobre esse processo de formação, trazendo obras que são emblemáticas para professores/as, pesquisadores/as e atores sociais ligados à história do trabalho. Em cada episódio, um/a especialista apresenta um livro de impacto em sua trajetória, assim como a importância da obra para a história social do trabalho. Em um formato dinâmico, com vídeos de curtíssima duração, procuramos conectar estudantes a pessoas que hoje são referências nos mais diversos temas, períodos e locais nos mundos do trabalho, construindo, junto com os convidados, um mosaico de clássicos do campo.

A seção Livros de Classe é coordenada por Ana Clara Tavares.

Contribuição Especial #25: A Greve dos 300 Mil: 70 anos


Murilo Leal
Professor da Unifesp


Em 26 de março, domingo, deveríamos celebrar uma efeméride. No mesmo dia do mês, há setenta anos, numa quarta-feira, 60 mil metalúrgicos e têxteis pararam seus teares e tornos e tomaram as ruas em São Paulo. Começava oficialmente a primeira greve geral operária do pós-guerra, conhecida como a Greve dos 300 Mil. Logo, marceneiros, vidreiros e gráficos se somariam ao movimento, que só se encerraria vinte e sete dias depois, em 23 de abril. Mas, consulte sua agenda; talvez esteja impresso: “Dia do Cacau” ou “Dia do Mercosul”, mas nunca “Dia da Greve dos 300 mil”.

É compreensível: as efemérides são consideradas eventos que, por suas características permanecem na história, ou datas em que se registram situações inesquecíveis, e uma greve geral operária não diz respeito à nacionalidade, nem ao comércio, à religião ou ao esporte. Diz respeito aos trabalhadores e trabalhadoras, aos explorados e sofredores. Sua memória coletiva, como toda a memória, vai se perdendo com a extinção dos vivos e só pode permanecer quando preservada e transmitida por “instituições”. Mas a memória não pode ser, simplesmente, depositada em uma “instituição”, como se fosse uma coisa. Ela é salva do esquecimento por alguma emoção, algum interesse e, então, reorganizada numa narrativa, representada em signos, pode ser celebrada como efeméride. Mas a quem interessa manter acesa a lembrança de uma greve geral operária? Os próprios despojados e suas famílias, sem tempo nem patrimônio, tendem a deixar triturar no moinho da vida seus sonhos e memórias. Restam as “instituições”, seus representantes, mas também eles, envolvidos com outros afazeres, podem não ter seus interesses e emoções despertados pela experiência de um movimento como a Greve dos 300 Mil.

Por que a Greve dos 300 mil é tão importante? Por sua duração, abrangência, repercussão política, pela riqueza de experiências que gerou e por ter sido um ponto superior em uma curva ascendente que começara finda a segunda-guerra, em 1946. Naquele ano, em fevereiro, mais de cem mil operários e operárias de diversas fábricas de São Paulo paralisaram as máquinas por aumento de salários e congelamento de preços da cesta básica. De janeiro a fevereiro, parede nacional dos bancários. No Rio de Janeiro, empregados da Light, dos Correios, estivadores e ferroviários também cruzavam os braços.

Em março de 1953, o movimento operário de São Paulo podia, portanto, contar com um rico repertório de experiências dos seis anos anteriores, e encontrou oportunidades melhores para sua organização e ação coletiva.  Das lutas do imediato pós-guerra, os grevistas de 1953 – provavelmente muitas vezes os mesmos homens, mulheres e jovens que haviam participado da experiência precedente – recolheram tradições de organização, a mais importante a de comissões de fábrica. De 33 greves realizadas em 1946 que se pôde pesquisar, quinze foram conduzidas por essas organizações de base e, a bem da verdade, a Greve dos 300 Mil não começou na quarta-feira, dia 26 de março, mas sim na segunda, dia 24, por iniciativa de operárias das comissões dos bairros do Brás e da Mooca que, na hora do lanche, saíram às ruas para pôr em prática seus planos. Dois dias depois, com o movimento já se espalhando, os sindicatos dos têxteis e dos metalúrgicos convocaram assembleias gerais e começaram o movimento oficialmente. Esta era uma possibilidade ausente em anos anteriores.

Em 1952, os “ministerialistas”, como eram chamados os “pelegos” na época, foram afastados do Sindicato dos Têxteis pela vitória da chapa liderada por Nelson Rusticci, um petebista “socialista-cristão”, em aliança com membros do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Em 3 de março de 1953, tomava posse a nova diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos, encabeçada por Remo Forli, militante socialista, tendo José de Araújo Plácido, membro do PCB, como vice, também aqui afastando a velha equipe de “ministerialistas”. Começava, então, uma renovação sindical de baixo para cima, que se materializou em maior participação de lideranças de base em diversos tipos de comissões; no crescimento do número de sindicalizados; no crescimento e formalização dos “delegados sindicais” – tudo isso por dentro da velha estrutura, formalmente subordinada ao Ministério do Trabalho.

A Greve dos 300 Mil não existiria sem as “comissões de solidariedade”, que funcionavam da seguinte maneira: assembleias de diversas categorias eram convocadas nos mesmos dias e horários. Os plenários decidiam, então, formar comissões com alguns trabalhadores que rumavam à reunião do outro sindicato para manifestar apoio e avaliar sobre as possibilidades de uma luta comum. Essa movimentação ficou registrada na ata da assembleia geral metalúrgica de 15 de março de 1953. Os trabalhos transcorriam com a discussão da ordem do dia quando entrou uma comissão de marceneiros “para pedirem solidariedade na sua luta por aumento de salários”. Em resposta, formou-se uma comissão de metalúrgicos para retribuir a visita. Nesse ínterim, conforme a ata, o presidente “informa à casa que acaba de chegar ao recinto a comissão dos têxteis, a qual é recebida com grandiosa salva de palmas”.

Manchete do jornal Voz Operária, nº 206, Rio de Janeiro, abril de 1953.

Também faziam parte do sistema organizativo as comissões de salários de cada categoria, que se transformaram em comandos de greve. Nos têxteis, por exemplo, a assembleia reunida em 15 de março, acatou proposta do líder Antonio Chamorro, de ampliar o número de membros da comissão de 7 para 35 – dos quais, registre-se, apenas quatro eram mulheres. Esses comandos, junto com as diretorias dos sindicatos, formaram em 10 de abril, o Comitê Intersindical de Greve que, por sua vez, criou uma sofisticada rede de departamentos, de finanças e abastecimento, propaganda, piquetes, entre outros. Finda a greve, o Comitê transformou-se, em setembro de 1953, na Comissão Intersindical do Estado de São Paulo (Ciesp) que, em 1954, passou a denominar-se Pacto de Unidade Intersindical, verdadeira central sindical paralela à estrutura oficial que chegou a reunir 83 sindicatos paulistas. Portanto, a greve de 1953 criou um sistema organizativo combinando a tradição de organizações de base com as novas possibilidades abertas pela renovação sindical.

O que dava vida e alma a esse sistema era uma enorme vontade coletiva de reagir contra o arrocho salarial e a fome. As principais reivindicações eram reajuste de 60% e congelamento dos gêneros da cesta básica. Uma pequena amostra da atmosfera reinante, é possível vislumbrar na nota de um informante do Deops, a polícia política, presente na assembleia têxtil que votou unanimemente pela greve: “Todos os oradores decorreram (sic) sobre o mesmo assunto, ‘aumento de salários, ‘carestia’, ‘feijão e arroz’, etc. Quando os oradores se manifestavam, os presentes davam vivas à greve”. O ímpeto da luta, a adesão massiva recebida, a percepção de uma oportunidade política, tudo isto levou os grevistas às ruas e esta foi outra característica fundamental do movimento.

Naqueles 27 dias, pelo menos seis passeatas foram realizadas, algumas, como a de 31 de março, sofrendo fortíssima repressão. Os trabalhadores e trabalhadoras de carne e osso, com seus vestidos de algodão, seus paletós surrados, suas bandeiras do Brasil e dos sindicatos, seu entusiasmo e coragem, conquistaram a solidariedade de populares e comerciantes, que compravam os bônus em apoio; atraíram a simpatia dos inquietos estudantes de Direito do Largo do S. Francisco, que resolveram trocar um martelo por um livro num ato público, “símbolos da cultura e do trabalho”; mobilizaram o apoio de parlamentares, como o vereador democrata-cristão Franco Montoro, que apresentou projeto de lei visando doação de 500 mil cruzeiros para o Fundo de Greve e até do prefeito recém-eleito, Jânio Quadros. Assim, com a Greve dos 300 mil, a classe trabalhadora de São Paulo conseguiu reforçar sua organização de base e, ao mesmo tempo, tecer alianças que criaram espaço para uma presença mais forte na arena pública, portanto na política. Uma dessas alianças deu-se com professores universitários e profissionais em pesquisas estatísticas para a crítica aos índices do custo de vida fornecidos por órgãos do Estado que serviam de referência para as negociações salariais. Em assembleia metalúrgica de dezembro de 1952, o então operário da Atlas, Paul Singer, propôs que os sindicatos se juntassem para elaborar um novo índice de aumento do custo de vida. A desconfiança com relação às perdas salariais reais também foi um fator de mobilização para a greve. Em dezembro de 1955, 22 sindicatos reunidos no Sindicato dos Bancários, fundaram o DIEESE, a mais longeva e importante organização de pesquisa e estudos fundada pelos sindicatos no Brasil.

Abria-se, a partir de 1953, um novo ciclo de greves e protestos que teria na Greve dos 400 Mil, de 1957 e na dos 700 Mil, de 1963, seus momentos mais intensos, com impacto direto na conjuntura que levaria ao golpe de 1964. Mas a repercussão política mais imediata e ruidosa do movimento foi a derrubada do odiado Ministro do Trabalho José Segadas Viana e sua substituição por João Goulart, logo em junho de 1953. Ou seja, a carreira do líder político mais eminente do projeto nacional-reformista pós-Vargas, muito deve ao movimento grevista de 1953.

Afinal, 32% de aumento foi obtido. Horizontes de vidas comuns se alargaram junto com as conquistas políticas e simbólicas da classe, como sugeriu a reportagem “Cinco vidas, cinco lutas por aumento”, publicada no Última Hora de São Paulo de 2 de maio de 1953. A tecelã Walderessa Rulfo, por exemplo, informou que faria o enxoval de seu casamento com o dinheiro do aumento. Secondo Lucera, de 70 anos, iria custear o tratamento médico do filho, com paralisia infantil.

Por alguns anos, a Greve dos 300 Mil foi uma efeméride comemorada nos sindicatos, como atesta a exposição de pinturas da artista Virgínia Artigas, inaugurada em abril de 1956, que percorreu várias entidades. Seus assuntos eram comícios nas portas de fábrica, piquetes, mães grevistas, jovem ferida, pixações, liberdade do preso grevista, entre outras. Depois, caiu no esquecimento.

Se algum dia, tornar-se de novo efeméride, deverá ser um momento de reflexão e de lembrança de alguns nomes que construíram a obra: Deolinda Nascimento, tecelã da comissão de fábrica da Matarazzo, na Mooca; Maria Grigaitis, tecelã, integrante da comissão de greve dos têxteis; Antônio Chamorro, tecelão, militante do PCB, membro da comissão de greve e principal liderança dos têxteis na greve; Francisco de Luca, membro da comissão de solidariedade do Sindicato dos Marceneiros; Severino M. da Silva. Membro da comissão de salários dos metalúrgicos e tantos outros, tantas outras…

Passeata de grevistas em 1953. Acervo do Centro de Memória Sindical

PARA SABER MAIS:

BARREIRO, Irlys Alencar Firmo. Autonomia da classe operária? A greve de 1953. Dissertação de Mestrado – Instituto de Ciências Humanas – Departamento de Ciências Sociais, Universidade de Brasília, DF, 1986.

COSTA, Helio da. Em busca da memória: comissão de fábrica, partido e sindicato no pós-guerra. São Paulo: Scritta, 1995.

LEAL, Murilo. A reinvenção da classe trabalhadora (1953-1964). Campinas: Editora da Unicamp, 2011.

MOISÉS, José Álvaro. Greve de massa e crise política: estudo da greve dos 300 Mil em

São Paulo, 1953/1954. São Paulo: Polis, 1978.

WOLFE, Joel. Working Women, Working Men: Sao Paulo & the Rise of Brazil’s Industrial Working Class, 1900-1955. Durham: Duke University Press, 1993.


Crédito da imagem de capa: Greve de 1953, Xilografia de Virgínia Artigas, 1953 (reprodução retirada da Internet)

Vozes Comunistas #22: Armando Ziller


Vale Mais é o podcast do Laboratório de Estudos de História dos Mundos do Trabalho da UFRJ, que tem como objetivo discutir história, trabalho e sociedade, refletindo sobre temas contemporâneos a partir da história social do trabalho.

“Vozes comunistas” é uma série especial do Vale Mais, podcast do LEHMT/UFRJ. Entre março de 2022 e março de 2023 homenageamos o centenário do Partido Comunista Brasileiro (PCB) com a divulgação de trechos de entrevistas de antigos sindicalistas, lideranças operárias e camponesas ou mesmo trabalhadores/as de base que contam um pouco da história do PCB e sua importância para a história do trabalho no Brasil.

Em nosso vigésimo primeiro episódio, penúltimo da série, apresentamos trechos de uma entrevista realizada em 1985 com o líder bancário mineiro Armando Ziller. Ziller ingressou no PCB em 1932 e tornou-se uma icônica liderança sindical dos bancários, participando de grandes lutas, como a greve nacional da categoria em 1946 e de importantes conquistas, como a jornada de 6 horas. Foi eleito deputado estadual em 1947, participando da elaboração da constituição mineira de 1947. No trecho que ouviremos, Armando Ziller fala sobre sua experiência sindical durante as décadas de 30 e 40. Esta voz comunista é apresentada pelo professor do Instituto de História da UFRJ, Carlos Ziller, também neto de Armando.

Projeto e execução: Ana Clara Tavares, Felipe Ribeiro, Larissa Farias e Paulo Fontes
Apoio: Centro de Documentação e Imagem da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Agradecemos às instituições e pesquisadores que gentilmente colaboraram com nosso projeto

Referência da entrevista: ZILLER, Armando. Entrevistadoras: DELGADO, Lucília de Almeida Neves e ALVES, Célia Regina. Belo Horizonte, MG, Brasil. Setembro de 1985. 4 fitas K7 (60 minutos). Acervo do Núcleo de História Oral do Laboratório de História do Tempo Presente da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (NHO/LHTP/FAFICH/UFMG).

Vale Mais #32: Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson, por César Queirós e Marcos Braga Vale Mais

Está no ar o quinto episódio da nova temporada do podcast Vale Mais, do LEHMT-UFRJ! Nesta temporada, convidamos pesquisadoras e pesquisadores para discutir projetos, livros e teses recentes que aprofundam debates interdisciplinares sobre os mundos do trabalho. Neste quinto episódio, conversamos com César Queiroz, professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), e Marcos Braga, professor da rede pública estadual de educação do Amazonas e doutorando do programa de pós-graduação em História da UFAM. Os convidados são organizadores do livro Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson. A obra é produto da disciplina “Trabalho e movimentos sociais na Amazônia”, oferecida no PPGH/UFAM, em 2024, em homenagem ao centenário de Edward Thompson, sendo o foco do curso debater as contribuições thompsonianas e as polêmicas que o envolveram ao longo de sua vida. Os/as alunos/as da disciplina elaboraram verbetes que fazem parte da composição desta breve dicionário. Não deixe também de compartilhar e acompanhar os próximos episódios! Entrevistadores: Ana Clara Tavares, Isabelle Pires, Josemberg Araújo, Larissa Farias e Thompson Clímaco Roteiro: Ana Clara Tavares, Isabelle Pires, Larissa Farias e Thompson Clímaco Produção: Ana Clara Tavares e Larissa Farias Edição: Josemberg Araújo e Thompson Clímaco Diretor da série: Thompson Clímaco Coordenadora geral do Vale Mais: Larissa Farias
  1. Vale Mais #32: Breve dicionário analítico sobre a obra de Edward Palmer Thompson, por César Queirós e Marcos Braga
  2. Vale Mais #31: Saraiva, Dantas e Cotegipe: baianismo, escravidão e os planos para o pós-abolição no Brasil, por Itan Cruz
  3. Vale Mais #30: A cultura de luta antirracista e o movimento negro do século 21, por Thayara Lima
  4. Vale Mais #29: The Second World War and the Rise of Mass Nationalism in Brazil, por Alexandre Fortes
  5. Vale Mais #28: O poder e a escravidão, por Bruna Portella e Felipe Azevedo